sexta-feira, 6 de março de 2009

Minha homenagem a Patativa do Assaré


Por Célia Leal


Se vivo, faria neste cinco de março, 100 anos de vida.


Figura legendária da poesia popular nordestina, o cantor e poeta social Antonio Gonçalves da Silva, o Patativa do Assaré, era um homem espirituoso que amava a vida. Se hoje estivesse vivo faria 100 anos. Em vida, passou dificuldades financeira e de saúde mas deixou um legado rico e imprescindível para, principalmente, os amantes da cultura e da poesia popular.Trabalhou na lavoura até os 63 anos, mas foi forçado a interromper as atividades na agricultura porque teve que amputar uma perna, perdeu a visão do olho direito e vivia com dificuldades na audição. Mesmo com a saúde abalada, Patativa foi uma pessoa forte, lúcida, capaz de “guardar” na memória toda a sua produção poética que encanta e comove quem conhece a sua obra.Este velhinho de 1,50m, simpático e falante fez do dom de improvisar versos a sua razão de viver. Na entrevista que reproduzimos a seguir, concedida a mim e ao jornalista Wellington Farias, quando estávamos no Jornal O Norte, em 1993, ocasião em que o poeta esteve na Capital paraibana, é a minha homenagem a Patativa que foi um grande exemplo de vida.


O senhor já pensou, pela sua importância, escrever as suas memórias?


Patativa do Assaré - Não. Eu ainda não escrevi minhas memórias porque todo mundo já sabe que sou agricultor pobre,vivo pegando na roça e nunca fiz profissão da minha capacidade de poeta. Vivo no meu canto, no interior do Ceará e atendia convite, quando era tocador de viola, para tocar em aniversário ou casamento que não tivesse dança. É porque o povo não sabe como é que eu sou agricultor e coloco em versos tudo aquilo que penso. Os poetas, eles escrevem. Eu só escrevo quando penso em publicar. Fica tudo retido na memória.


Não acha que sua produção deve ficar registrada, até mesmo para valorizar a poesia popular?


Patativa- Mas já estão quase todas publicadas. Tenho os livros “Patativa do Assaré”, “Inspiração Nordestina”, “Cante Lá que eu Canto Cá”, “Inspinho e Fulô” e muitas outras coisas. Minha poesia é muito simples, sou poeta do povo, canto aquilo que …olhe vou lhe mostrar como é a minha poesia(recita um verso)


O senhor era também cantador de viola?


Patativa - Eu fui um cantador de viola sem fazer profissão.Cantei com Lourival Batista, que morreu há pouco tempo. Um grande repentista. A voz dele era dissonante. Ele não tinha entoação, mas de improviso era bom. Deixei de cantar há muitos anos.Cantava por esporte.


“O Brasil de Cima e o Brasil de Baixo” ainda estão diferentes?


Patativa - Tudo que procuro, acho.(Recitou o verso “Brasil de Cima e Brasil de Baixo”)…”talvez isso ainda aconteça que o Brasil de Cima desça e o Brasil de Baixo suba” e isso tá longe de acontecer porque os brasileiros não querem. Eles são subordinados por outros países, principalmente o americano. Eu tô pra viver um Brasil bom. Nunca vi nem hei de ver.


O senhor está desiludido com a situação do brasileiro, não tem mais a menor esperança?


Patativa – Não, não tenho. Só poderia haver mudanças com a educação de uma nova geração. Mas com esses caras da atualidade, que só pensam em roubar, não obedecem ordem, coisa nenhuma.Eu não acredito. Eu sei que não sei pensar. Sou um caboclo que vivo lá no mato, mas vejo o que aconteceu. Esse Fernando Collor de Mello fez a maior meladeira.


Que recordação o senhor tem da sua convivência com Luiz Gonzaga?


Patativa – Nós sabemos, acho que vocês sabem também, que Luiz Gonzaga não foi compositor. Foi o maior cantor no nosso gênero, mas compositor ele não foi. Só fazia uma letra para propaganda comercial. Ele apanhava uma música que já tinha saído da moda e fazia um versinho mas eu tenho a maior saudade dele.Ele era um homem grosseiro, vaidoso, tinha o hábito de adular os grandes e tal. Mas deixando essa parte um pouco desagradável, quero falar que a natureza lhe deu o dom de cantar com perfeição, atrás de todo mundo. Olhe, eu estava no Memorial da América Latina, em São Paulo, quando morreu Luiz Gonzaga, por isso que não acompanhei o cortejo fúnebre no sepultamento do rei do baião e fiz um verso para marcar o momento.

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