quinta-feira, 7 de maio de 2009

Americano guarda sucata e aprende a empobrecer

Do Terra Magazine

Por Carlos Drummond

De Campinas (SP)

Enquanto a recuperação da economia não vai muito além de sinais esparsos de melhora, o cidadão dos Estados Unidos vai se adaptando à dura realidade da crise. A sociedade extravagante que costumava produzir 250 milhões de toneladas anuais de sucata está aprendendo a viver de modo espartano. A destruição de empregos, o despejo das famílias e o achatamento do consumo provocados pela crise econômica nos Estados Unidos promovem, desde o final do passado, uma ampla reeducação de hábitos. O descarte de materiais e de bens de consumo usados caiu 30%, segundo cálculo publicado pelo jornal Washington Post. A queda das compras fez diminuir a fabricação e a embalagem de produtos e a consequente produção de lixo, reciclável e não reciclável. A indústria da construção em crise reduziu as demolições e a quantidade de táboas, ferragens e vidros normalmente reprocessados ou reaproveitados em reformas ou novas obras.
Mesmo sem o desejar, o americano tornou-se mais engajado na sustentabilidade ambiental, ao baixar o consumo da energia embutida em todo produto da indústria de transformação e ao diminuir a respectiva produção de sucata e de lixo. O conserto e o comércio de bens usados movimenta sites criados com a crise, que reunem dezenas de milhares de internautas. Os negócios de consertos de carros, computadores e eletrodomésticos florecem ao mesmo tempo em que caem as vendas de produtos das indústrias automobilística, de informática e da chamada linha branca. Os consertos, sempre retomados nas crises, tornaram-se um negócio que já consome 5% dos orçamentos familiares, calcula o economista Louis Johnston.
As mesmas famílias que reduzem a compra de roupas suspendem o descarte e as doações das peças de vestuário gastas ou apenas usadas, agora remendadas e consertadas. Empresas como a Wal-Mart e a Coca-Cola contribuem com a contração geral, ao cortarem gastos com empacotamento e programarem a utilização de embalagens mais baratas.
A sociedade com 5 milhões de desempregados só neste ano, 47 milhões de pessoas sem qualquer assistência de saúde e 3 milhões ou mais de famílias despejadas enxergou-se com horror nas imagens televisivas dos acampamentos de cidadãos subitamente destituídos de teto e de emprego e que vivem em estado miserável nos arredores de cidades da Califórnia. O espetáculo de pobreza, que chocou inclusive o governador Arnold Schwarzenegger, faz lembrar de raras imagens da crise de 1929. Quem atravessasse o famoso Central Park, em Nova Iorque, nesse período fatídico inevitavelmente veria pequenas favelas e pessoas maltrapilhas cozinhando ao ar livre em caldeirões suspensos sobre fogueiras.
Carlos Drummond é jornalista. Coordena o Curso de Jornalismo da Facamp.

Um comentário:

  1. Tudo tem seu lado bom. As crises também. Servem para revermos nossos parâmetros de vida.

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