Por Sérgio Barbosa de Almeida
No momento em que se discute em Copenhagen como reorganizar as atividades humanas, que aceleram as mudanças climáticas em escala planetária e colocam em risco a vida de boa parte dos habitantes da Terra, não há como manter em segundo plano a questão da fome, que voltou a se alastrar no mundo a partir de 2005. A solução desse obsceno problema está intimamente ligada às mudanças climáticas. A reunião de cúpula convocada pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura – FAO, em meados de novembro, em Roma, mereceu pouca atenção dos países ricos, cujos chefes de Estado se abstiveram de participar, à exceção do da Itália, país anfitrião do encontro.
Mas qual é o tamanho do problema? Em 2009, a FAO estima em mais de um bilhão o número de pessoas subalimentadas, ou seja, um em cada seis habitantes do planeta. A Ásia contribui com 640 milhões de “famintos”, a África e Oriente Médio com 310 milhões, a América Latina com 53 milhões e, pasmem, os países ricos com 15 milhões. Atualmente, a cada seis segundos uma criança morre de fome no mundo e as perspectivas de curto prazo são assustadoras. Segundo Olivier de Schutter, Relator da FAO para o direito à alimentação, “todas as condições para uma nova crise alimentar (sic) nos próximos dois anos estão reunidas; não se trata de saber se ela ocorrerá, mas sim quando” (Fonte: Le Monde, 16/11/2009). Apesar da afirmação do Relator, a fraqueza política da FAO pode ser constatada ao se verificar que as projeções de redução da fome, pactuadas entre os países membros, são sucessivamente revistas para pior: em 1991, foi ‑
estabelecida a meta de se reduzir à metade, até 2015, o número de 840 milhões de subnutridos. Em 2005, a meta para 2015 foi elevada de 420 para 750 milhões, mas não ocorreu uma redução dos subnutridos e sim seu crescimento para um bilhão de pessoas (Ver figura abaixo, publicada no jornal conservador Le Figaro, de 16/11/2009). Além disso, o encontro de Roma encerrou-se sem que os países ricos assumissem compromissos com as demandas de Jacques Diouf, Secretário-Geral da FAO há 15 anos, seja em termos dos aportes financeiros solicitados seja em relação à proposta de “Fome zero”, primeiro dos Objetivos do Milênio, estabelecidos em 2000. Ironicamente, convivemos também com meio a um bilhão de pessoas afetadas por problemas de saúde decorrentes do excesso ou da inadequação alimentar, muitas delas pobres, com acesso apenas a alimentos que “matam” a fome, mas que não nutrem suficientemente e provocam problemas de obesidade e outras doenças.
Durante o encontro da FAO, a Via Campesina e outras organizações sociais realizaram um evento paralelo, no qual intensificaram a defesa do conceito de “Soberania alimentar”, em contraposição ao de “Segurança alimentar”, divergência que transcende a questão semântica. Na prática, a “segurança ‑
alimentar” como entendida pelos governos representados na FAO baseia-se na disponibilização de novos recursos financeiros para a intensificação da chamada “Revolução Verde”, cujos fundamentos são o desenvolvimento intensivo de monoculturas em grandes áreas de terra – compreendendo a irrigação e o uso de adubos químicos –, o uso de sementes selecionadas, que rapidamente confundiu-se com o de sementes geneticamente modificadas, combinado com o de agrotóxicos, produzidos e controlados por um número reduzido de empresas.
Por seu turno, a proposta de “soberania alimentar” reafirmada por organizações que congregam pequenos agricultores, trabalhadores rurais sem terra, povos das florestas e pescadores artesanais, dentre outros grupos, baseia-se no “direito humano fundamental de todos os povos, nações e Estados definirem seus próprios sistemas e políticas de produção alimentar”, de forma a assegurar o acesso a todos a uma alimentação adequada e saudável, que respeite a diversidade cultural dos povos, aí incluídos os saberes e hábitos tradicionais, alimentares e lingüísticos. As organizações presentes ao encontro paralelo redigiram o documento “Políticas e ações para erradicar a fome e a subnutrição”, disponível no site www.eradicatehunger.org em espanhol, francês e inglês, que apresenta de forma meticulosa e abrangente as engrenagens do sistema dominante de oferta de alimentos, bem como as alternativas para superação do problema da fome no planeta. No documento são abordadas: a) as deficiências e limitações do processo dominante de suprimento alimentar da população mundial; b) a visão conceitual de soberania alimentar; c) as formas de acesso a uma agricultura em bases sustentáveis; d) a relação entre meio ambiente, mudanças climáticas e agro combustíveis; e) a relação ‑ entre mercados, políticas de preços e subsídios agrícolas; f) o papel dos Estados e instituições internacionais.
Mas qual é o tamanho do problema? Em 2009, a FAO estima em mais de um bilhão o número de pessoas subalimentadas, ou seja, um em cada seis habitantes do planeta. A Ásia contribui com 640 milhões de “famintos”, a África e Oriente Médio com 310 milhões, a América Latina com 53 milhões e, pasmem, os países ricos com 15 milhões. Atualmente, a cada seis segundos uma criança morre de fome no mundo e as perspectivas de curto prazo são assustadoras. Segundo Olivier de Schutter, Relator da FAO para o direito à alimentação, “todas as condições para uma nova crise alimentar (sic) nos próximos dois anos estão reunidas; não se trata de saber se ela ocorrerá, mas sim quando” (Fonte: Le Monde, 16/11/2009). Apesar da afirmação do Relator, a fraqueza política da FAO pode ser constatada ao se verificar que as projeções de redução da fome, pactuadas entre os países membros, são sucessivamente revistas para pior: em 1991, foi ‑
estabelecida a meta de se reduzir à metade, até 2015, o número de 840 milhões de subnutridos. Em 2005, a meta para 2015 foi elevada de 420 para 750 milhões, mas não ocorreu uma redução dos subnutridos e sim seu crescimento para um bilhão de pessoas (Ver figura abaixo, publicada no jornal conservador Le Figaro, de 16/11/2009). Além disso, o encontro de Roma encerrou-se sem que os países ricos assumissem compromissos com as demandas de Jacques Diouf, Secretário-Geral da FAO há 15 anos, seja em termos dos aportes financeiros solicitados seja em relação à proposta de “Fome zero”, primeiro dos Objetivos do Milênio, estabelecidos em 2000. Ironicamente, convivemos também com meio a um bilhão de pessoas afetadas por problemas de saúde decorrentes do excesso ou da inadequação alimentar, muitas delas pobres, com acesso apenas a alimentos que “matam” a fome, mas que não nutrem suficientemente e provocam problemas de obesidade e outras doenças.
Durante o encontro da FAO, a Via Campesina e outras organizações sociais realizaram um evento paralelo, no qual intensificaram a defesa do conceito de “Soberania alimentar”, em contraposição ao de “Segurança alimentar”, divergência que transcende a questão semântica. Na prática, a “segurança ‑
alimentar” como entendida pelos governos representados na FAO baseia-se na disponibilização de novos recursos financeiros para a intensificação da chamada “Revolução Verde”, cujos fundamentos são o desenvolvimento intensivo de monoculturas em grandes áreas de terra – compreendendo a irrigação e o uso de adubos químicos –, o uso de sementes selecionadas, que rapidamente confundiu-se com o de sementes geneticamente modificadas, combinado com o de agrotóxicos, produzidos e controlados por um número reduzido de empresas.
Por seu turno, a proposta de “soberania alimentar” reafirmada por organizações que congregam pequenos agricultores, trabalhadores rurais sem terra, povos das florestas e pescadores artesanais, dentre outros grupos, baseia-se no “direito humano fundamental de todos os povos, nações e Estados definirem seus próprios sistemas e políticas de produção alimentar”, de forma a assegurar o acesso a todos a uma alimentação adequada e saudável, que respeite a diversidade cultural dos povos, aí incluídos os saberes e hábitos tradicionais, alimentares e lingüísticos. As organizações presentes ao encontro paralelo redigiram o documento “Políticas e ações para erradicar a fome e a subnutrição”, disponível no site www.eradicatehunger.org em espanhol, francês e inglês, que apresenta de forma meticulosa e abrangente as engrenagens do sistema dominante de oferta de alimentos, bem como as alternativas para superação do problema da fome no planeta. No documento são abordadas: a) as deficiências e limitações do processo dominante de suprimento alimentar da população mundial; b) a visão conceitual de soberania alimentar; c) as formas de acesso a uma agricultura em bases sustentáveis; d) a relação entre meio ambiente, mudanças climáticas e agro combustíveis; e) a relação ‑ entre mercados, políticas de preços e subsídios agrícolas; f) o papel dos Estados e instituições internacionais.
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